Éramos todos invisíveis, correndo sem freio e um dia, depois da curva, aquela mais conhecida de todos os dias de nossas vidas, tivemos que frear bruscamente, quase capotando.
Uma sensação de quase morte, de ter escapado por um fio, percorreu a mente em segundos.
E, nesse momento, olhamos para trás, e voltamos para nossos bairros, para os comércios locais, voltamos a valorizar o pequeno e seu grande esforço de sobrevivência, que sempre esteve lá.
Começamos a cumprimentar com um olhar mais terno os vizinhos, a valorizar o abraço ou o beijo dado quase sem contato, o simples ‘bom dia’ e até aquela conversa improvisada que preenchia o vazio de um encontro casual. Tudo, de repente, pareceu ser tão importante.
Tivemos que nos isolar, descobrimos que os estranhos estavam em casa, isso nos deu angústia, porque tivemos que conviver diariamente com nossa própria família, reencontramos nossas crianças e percebemos que pouco sabíamos de suas capacidades e necessidades.
Voltamos a limpar nossas casas e a fazer a nossa comida.
Voltamos a telefonar para nossos pais, para amigos distantes e a ter medo de perdê-los.
Despencamos drasticamente do alto da soberba à impotência e ignorância do desconhecido.
Voltamos a ser simplesmente frágeis e humanos.
E, nesse momento que estamos próximo a abrir as portas, a polvilhar as ruas novamente, a preencher o mundo, podemos pensar como medida de prudência, que ao invés de usarmos o freio, apenas passemos a correr menos, assim, quem sabe, nunca mais será necessário usar o freio tão bruscamente e possamos trocar nossos invisíveis atos impensados por ato de amor verdadeiro.